quinta-feira, 5 de julho de 2012

"As estradas eram percorridas por loucos do volante, estupidamente orgulhosos da sua condução desportiva e que enchiam cemitérios e unidades de cuidados intensivos com as suas vítimas.
Nas fábricas e nos escritórios, operários e empregados eram obrigados a trabalhar como máquinas e dispensados quando se cansavam. Os patrões exigiam um rendimento permanente, humilhavam e rebaixavam os seus subordinados. As mulheres eram assediadas: havia sempre um espertalhão convencido que lhes beliscava as nádegas já de si massacradas pela celulite. Os homens eram constantemente pressionados para serem bem-sucedidos, e nem umas curtas férias os libertava desse fardo. Os colegas vigiavam-se mutuamente com raiva, desforravam-se nos mais fracos, levando-os ao esgotamento nervoso ou a coisas ainda piores.
Se a pessoa bebia, começava a ter problemas no fígado e no pâncreas; se comia à vontade, o índice de colesterol aumentava; se fumasse, agarrava-se-lhe aos pulmões um cancro assassino - fizesse o que fizesse, o finlandês arranjava sempre maneira de culpar o vizinho. Alguns praticavam jogging dogmaticamente, até caírem exaustos no meio da pista coberta de cinza. Quem não corresse, ficava obeso, sofria das articulações e das costas e, no fim de contas, morria à mesma com uma paragem cardíaca.
Em conversa sobre todas estas coisas, os suicidas começavam a dizer-se que, bem vistas as coisas, até estavam em melhor situação que os seus compatriotas, obrigados a permanecer na sua sinistra pátria. Esta constatação encheu-os de felicidade pela primeira vez há muito tempo.
Mas todo o grupo tem o seu desmancha-prazeres. Seppo Sorjonen, o empregado de mesa a recibos verdes, começou a evocar as suas lembranças da Finlândia sem pedir licença a ninguém. O pior era que as suas recordações eram todas, sem excepção, positivas! Deu como exemplo a sauna. Sorjonen achava que só o facto de existir sauna pressupunha já que nenhum finlandês, quaisquer que fossem as circunstâncias, teria alguma vez o direito de se suicidar - pelo menos, não antes de um bom banho de vapor."

Arto Paasilinna, "Um Aprazível Suicídio em Grupo" 

1 comentário:

  1. lol! Isto promete! Será que na Finlândia as coisas não são como estão descritas no início da citação? Ou será que a mera existência de saunas faz toda a diferença? É porque eu diria que se trata de uma descrição do infernozinho em que vivemos mergulhados, nós, das sociedades ditas industrializadas, sem grande excepção... mas se a Finlândia fosse diferente, era de reconsiderar a proposta do sr. primeiro ministro... :P

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