sábado, 17 de novembro de 2012

"Mas no seu coração acendia-se novo inferno: o mais terrível de todos, aquele onde as serpentes mordem o próprio coração com os dentes aguçados, nele infiltrando a peçonha mais corrosiva: o inferno do ciúme.
Ao ver Anhelete tão fresca e gentil, tão inocentemente feliz, ao vê-la no momento exacto em que ela ia passar a ser pertença de outro, Teobaldo, que havia três meses não pensava sequer nela, que não tinha intenção de cumprir a promessa que lhe fizera, Teobaldo convenceu-se de que nunca deixara de a amar.
Afigurou-se-lhe que Anhelete lhe havia jurado fidelidade ou que Engoulevent lhe estava a arrebatar o que era propriedade sua.
Quase saltou para fora do esconderijo, censurando à jovem a sua traição.
Anhelete, agora que se lhe esquivava, adquiria aos olhos de Teobaldo virtudes, qualidades, vantagens que ele não tinha suspeitado no momento em que, para as possuir, lhe teria bastado uma palavra.
Depois de ter experimentado todas as decepções que tinha experimentado, depois de perder aquilo que ele considerava o seu tesouro, aquilo de que a qualquer momento se poderia apoderar, pois não lhe passava pela cabeça que outro lho pudesse cobiçar, pareceu-lhe a última das partidas do destino.
Por ser mudo, o seu  desespero não foi mais profundamente triste: mordia as mãos, batia com a cabeça no tronco da árvore. Chorava e soluçava.
Mas tais lágrimas e suspiros não eram daqueles que, enternecendo o coração, servem de transição entre um mau sentimento e um bom: não, tais lágrimas e suspiros, então mais inspirados pela fúria e pela raiva que pelo o arrependimento, tais lágrimas e suspiros não lograram expulsar o ódio da alma de Teobaldo.
Até parecia que uma parte das lágrimas se derramava para fora, enquanto outra parte escorria para dentro, caindo-lhe sobre o coração como outras tantas gotas de fel.
Convencera-se de que adorava Anhelete."

Alexandre Dumas, O Lobisomem

1 comentário:

  1. Credo... pertença, propriedade... não admira que o mundo ande tão torto ainda hoje...

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